Experiências de projetos comunitários no Brasil, Caribe e EUA são apresentadas em seminário
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A tarde de quarta-feira (21) foi de apresentação de projetos contra a criminalidade entre jovens no 1º Seminário Internacional de Enfrentamento à Violência Contra a Juventude Negra que ocorreu no Everest Hotel Porto Alegre. O encontro foi aberto na terça-feira (20), Dia Nacional da Consciência Negra, e seguiu até quarta com palestras.
A primeira mesa da tarde teve o coordenador do Programa de Segurança Cidadã do Governo Federal de Trinidad e Tobago, Gregory Sloane-Seal, e o superintendente da Juventude no Rio de Janeiro, Allan Borges, além do mediador, o coordenador da Juventude da Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos (SJDH) do Estado, Maurício Piccin. Antes de Gregory e Allan apresentarem os programas implantados em suas cidades, Piccin adiantou que no RS a violência tem três aspectos que são idade, raça e território. “Esses três fatores contribuem muito para a violência contra essas pessoas e a conseqüência é o enorme número de homicídios contra elas”, disse ele.
Gregory apresentou o programa que coordena na ilha caribenha de 1,3 milhão de habitantes que em 2004 vivia uma guerrilha urbana com alta taxa de mortalidade. Por isso, a polícia pediu que o governo criasse programas sociais para prevenir a criminalidade e dar segurança à população. “Com o apoio financeiro do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), criamos o programa com sete passos para a mudança social baseado em um modelo australiano”, contou ele. Segundo Gregory, o primeiro passo é conhecer o problema. Depois, convencer a comunidade que a mudança será boa para ela, dar acesso aos serviços educacionais, de saúde e sociais, além de estimular a população a ter a polícia como aliada e amiga.
De acordo com uma pesquisa realizada para o programa, os principais fatores de risco nas comunidades são histórico familiar de violência e negligência dos pais, falta do que fazer, motivo esse que os leva para as ruas, além de dificuldade de aprendizado, gravidez precoce e uso de drogas ou álcool. “Em Trinidad e Tobago, é muito fácil o acesso a maconha e ao álcool, mas principalmente às armas de fogo. Os jovens quando seguram uma arma se sentem com poder. Também há muita falta de coesão na comunidade, como vizinhos que não se falam e baixa manutenção de casas que ficam abandonadas e viram cenários de crimes”, contou o palestrante.
Gregory aconselhou o governo a ter um mapeamento para saber quais locais precisam mais de investimentos e serviços. “Só com esse mapeamento conseguirá se desenhar o programa dos desejos da comunidade”, disse ele, acrescentando que esse programa deve ter treinamento profissional, aconselhamento e empreendimentos baseados na comunidade, como apoio aos pais e parcerias com escolas. “A gente quer que os jovens usem a sua energia. Sugiro ao Estado e as cidades construírem áreas recreacionais para eles”, opinou ele, reafirmando que a polícia comunitária deve ter um diálogo diferente da tradicional e estratégico para o bom relacionamento com as pessoas.
Centros da Juventude
Superintendente da Juventude no Rio de Janeiro, Allan Borges apresentou como funcionam os Centros de Referência da Juventude (CRJ) nas comunidades pacificadas naquele Estado. O CRJ é o programa de inclusão e oportunidades para cerca de 4 milhões de jovens cariocas de 15 a 29 anos semelhante aos Centros POD Juventude que estão sendo instalados no RS. Atualmente, 10 comunidades possuem CRJ e outras 20 irão ganhar em 2013.
Allan enfatizou que é preciso criar um processo de autonomia para a juventude e acabar com o preconceito de desconfiar dos jovens negros. “Os jovens têm de ser vistos como uma potência”, disse ele. O projeto da superintendência da Juventude no RJ tem como principais objetivos romper o ciclo de reprodução da desigualdade e restaurar a esperança da juventude em relação ao futuro.
Assim como Gregory, Allan também reforçou a importância da transversalidade. Segundo ele, nas favelas do RJ, os centros de saúde, de assistência social e as escolas não se comunicam, o que dificulta o trabalho. De acordo com ele, é preciso criar espaços para os jovens se encontrarem e demonstrarem suas habilidades, principalmente com o esporte e a cultura. “A juventude não quer mais só reforço escolar e inclusão digital. Precisamos contribuir com a inclusão social e produtiva nas comunidades pacificadas. As bolsas (remuneração) que eram oferecidas pelo Estado não tinham como competir com o narcotráfico porque eram muito baixos. Hoje, temos um atendimento personalizado aos jovens, acompanhamos a vida dele”, contou Allan.
Conforme o superintendente, os egressos do sistema socioeducativo, os que foram ou estão vinculados às redes de tráfico, grávidas e mães, dependentes químicos e aqueles que não estudam nem trabalham têm prioridade neste atendimento personalizado. O projeto foi implantado graças a um financiamento de US$ 84 milhões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).
Ações de prevenção
A última mesa do seminário intitulada A Articulação de Atores Federais, Estaduais e Locais para a Prevenção e Redução da Violência Juvenil, teve como participantes o coordenador do Fórum Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Juventude e membro do Departamento de Justiça dos EUA, Thomas Abt, e o representante da Secretaria Nacional da Juventude Neri da Costa. O painel foi mediado pela diretora de Direitos Humanos e Cidadania da Secretaria da Justiça e dos Direitos Humanos, Tâmara Biolo Soares, que se disse feliz ao ver que o RS está implementando programas semelhantes aos que já deram certo em outros lugares. “Temos uma política pública em curso que é o Programa de Oportunidades e Direitos (POD). Vamos ter um financiamento de US$ 50 milhões do BID para prevenção e redução da violência no Estado. Essa política já é uma realidade”, afirmou Tâmara.
Para Abt, a violência contra os jovens tem consequências muito grandes, que afetam a economia, os negócios, o aprendizado na escola e o desenvolvimento no trabalho, além de depressão para quem não consegue lidar com as perdas. Como em muitos outros lugares, nos EUA, a violência se concentra nas comunidades mais pobres em que os mais vulneráveis são os negros e os latinos.
Na tentativa de combater a criminalidade, o governo do presidente Barack Obama reuniu sete agências federais para atuarem juntas, como a Justiça, Saúde, Controle de Drogas. “O problema não pode ser solucionado só por uma pessoa. Todos têm que se juntar com abordagens equilibradas. É claro que temos de ter uma polícia envolvida, mas exigimos muito deles, apresentamos um problema de anos de desigualdade para eles resolverem. Precisamos de prevenção, intervenção e reforço, de estarmos evitando que novas crianças se envolvam no crime”, opinou ele.
Abt reafirmou a necessidade dos estados terem estatísticas bem focadas, como os bairros onde acontecem os crimes, as pessoas envolvidas no crime, os endereços onde mais acontecem, as danceterias, bares e locais de reuniões, além dos horários mais perigosos. Ele também acredita que o respeito da comunidade é obtido através do diálogo e que a polícia deve ganhar a confiança das pessoas.
O Fórum Nacional de Enfrentamento à Violência contra a Juventude, coordenado por Abt, foi até as cidades ouvir as pessoas e solicitar que as cidades elaborassem seus planos de combate à criminalidade. Esses planos são apoiados pelo governo federal, que disponibiliza especialistas para trabalharem com as comunidades nas escolas públicas. “As cidades elaboram os seus planos e mostram os resultados como a diminuição de crimes, melhora na saúde, nos serviços e no número de empregados. Vamos até as cidades ver o que estão fazendo, temos um jornal e estamos sempre nos comunicando. Cada cidade adapta-se a sua realidade”, diz ele.
Juventude Viva
Já Neri da Costa apresentou o Plano Juventude Viva, desenvolvido pelo governo federal para ser compactuado com os Estados em 2013. A iniciativa inclui programas voltados à redução da vulnerabilidade da juventude negra e da violência e à garantia de seus direitos.
As ações de prevenção têm por objetivo reduzir a vulnerabilidade dos jovens em situações de violência física e simbólica, criando oportunidades que garantam a inclusão social e a autonomia, a oferta de equipamentos, serviços públicos e espaços de convivência em territórios que concentram altos índices de homicídios. Outro eixo é o aprimoramento da atuação do Estado no enfrentamento ao racismo institucional e na sensibilização dos agentes públicos para a questão. O plano começou a ser implementado em Alagoas no mês de setembro deste ano e será expandido para outros cinco Estados no primeiro semestre de 2013.
O Juventude Viva foi construído por meio de um processo participativo, com o envolvimento dos movimentos juvenis, do movimento negro, de representantes do Hip Hop, de especialistas em segurança pública e pelos diálogos com atores governamentais, nas esferas federal, estadual e municipal. A execução envolve, além da Secretaria-Geral da Presidência e a Seppir, os ministérios da Justiça, Saúde, Educação, Trabalho e Emprego, Cultura e Esporte, em conjunto com os Estados, municípios, sociedade civil, Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública, entre outros parceiros.
“O objetivo é reduzir a violência juvenil através de uma estratégia conjunta e de colaboração entre os diversos órgãos. Temos visto o quanto a sociedade civil quer participar e devemos aproveitar isso”, concluiu Costa.